Uma dose extra de informação sobre a vacina contra Covid
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No mundo, 14 vacinas chegaram à fase 3, a mais avançada de testes, trazendo esperança em meio à tragédia da pandemia. Seis delas saíram à frente e já apresentam resultados, ainda que não definitivos. Mas há ainda questões fundamentais sobre como as vacinas funcionam e o que esperar para os próximos meses”. Este é o tom do extenso material publicado ontem no jornal “O Globo” sobre as vacinas que estão em teste ou já estão sendo aplicadas, no mundo, para conter a pandemia que nos assola. Assinado pela repórter de Ciências Ana Lucia Azevedo, a reportagem põe pingos nos is e elucida uma série de dúvidas a respeito do imunizante.

Acima de tudo, é preciso estar muito atento: mesmo depois de imunizada com uma dessas 14 vacinas, no mundo, que já chegaram à fase mais avançada dos testes, a pessoa pode ser infectada pelo vírus. O que a vacina vai evitar – e isso, claro, já é um grande passo – é que a pessoa contraia a doença Covid.

De qualquer forma, depois de ouvir a epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunizações (PNI) até 2019; Herbert Guedes, professor do Instituto de Microbiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em vacinas; a virologista Clarissa Damaso; e a virologista e imunologista Luciana Barros de Arruda, do Instituto de Microbiologia da UFRJ, a conclusão é que seis vacinas já apresentam resultados, ainda que não definitivos.

Foi um importante passo da Ciência. Mas é muito, muito importante que os cidadãos e cidadãs tenham informação suficiente para acompanhar todo o processo e perceber em que medida cada um se afeta. Por isso estamos reproduzindo aqui a reportagem, que tem dados atualizados. Vale a pena ler (https://oglobo.globo.com/sociedade/vacinas-contra-covid-19-saiba-tudo-sobre-os-efeitos-colaterais-eficacia-plano-de-vacinacao-24792472).

Só as vacinas, diz a repórter, “podem interromper a circulação do coronavírus de forma controlada e sustentada. Mas isso só deverá ocorrer quando uma parcela significativa da população for vacinada. Essa parcela deve ser de cerca de 70% da população, se a eficácia das vacinas for elevada (acima de 90%), explica a epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunizações (PNI) até 2019.  Com a vacinação em massa da população, será possível controlar a disseminação do coronavírus, pois ele não encontrará hospedeiros”.

Funciona assim: “Quando uma pessoa é vacinada, seu sistema de defesa é “apresentado” de forma segura a um vírus ou bactéria. Ele passa então a reconhecer o patógeno e produz anticorpos, proteínas dedicadas a combater doenças. Mas os anticorpos são apenas parte da proteção oferecida pela vacina. Ela também estimula células do sistema de defesa a “lembrarem” do vírus e de como devem combatê-lo. Se a pessoa imunizada for exposta ao vírus, ela terá as defesas prontas para debelá-lo antes que uma infecção possa se instalar. O sistema imunológico humano tem células de memória e é por isso que as vacinas funcionam.”

Sobre a eficácia da vacina, os especialistas ouvidos para a reportagem garantem que “Nenhuma das vacinas em fase mais avançada de desenvolvimento emprega o vírus Sars-CoV-2 enfraquecido (atenuado), que seria a única possibilidade, ainda que remota, de haver reversão da forma atenuada para a ativa. Desta forma, nenhuma vacina poderá causar a doença. Ninguém pegará Covid-19 de uma vacina”.

Mas, atenção: as vacinas não podem alterar o genoma, causar mutação e/ou danos genéticos, informação que vem circulando à larga. Não é verdade, não há nenhum dado científico que comprove.

A melhor vacina será aquela que conseguir eliminar a transmissão do vírus, tiver maior eficácia e proteção e maior alcance na população sem efeitos adversos, diz a reportagem. Por isso que, num contexto de pandemia, diferentes estratégias de vacinação são muito bem vindas. Isso aumenta a chance de maior imunização da população.

Uma vez realizada a vacinação, a vacina continuará sendo testada, informam os especialistas. “Os testes prosseguem, como explicado, depois da aprovação emergencial, e especialistas discutem se é ético manter os grupos controle, não vacinados, mesmo após a vacina ficar disponível. Outra complicação é a dificuldade de se encontrar voluntários e assim analisar a segurança e a duração da proteção.”

No Brasil, atualmente, há quatro vacinas em teste. Cabe à Anvisa, agência regulatória brasileira de saúde, aprovar o uso de uma delas, seja a licença regular ou para uso emergencial. É a empresa desenvolvedora e não os estados que devem solicitar o registro, após a comprovação da eficácia e segurança da vacina. “A empresa desenvolvedora deve enviar à Anvisa documentos técnicos e regulatórios com dados de segurança, eficácia e qualidade da vacina.”

“Há grupos de pesquisa brasileira desenvolvendo estudos pré-clínicos, mas, sem um investimento maciço, ainda que os imunizantes nacionais sejam promissores, jamais sairão dessa fase. O Brasil é um grande fabricante de vacinas, mas jamais desenvolveu um imunizante nacional, apenas copia o que é criado fora. O país tem cientistas, mas não dispõe de infraestrutura, sequer tem técnicos suficientes e laboratórios adequados para tanto”, diz a reportagem.

Uma vez aprovada a vacina, “a primeira fase do plano de vacinação contemplará trabalhadores de saúde, idosos acima de 75 anos, idosos com mais de 60 anos que estejam em asilos e população indígena”. Para o restante da população ainda não há data disponível e os especialistas acreditam que, dificilmente, a maior parte da população vá ter acesso ao imunizante antes do segundo semestre de 2021.

Os maiores desafios para a vacinação contra a Covid no Brasil, na realidade, são muitos:

“ O primeiro é a obtenção de um imunizante devidamente testado para segurança e eficácia em doses suficientes. Mas isso é só o início. A vacinação tem uma logística complexa, que envolve, dentre outros, armazenamento, transporte, distribuição, treinamento do pessoal que fará a vacinação, campanhas de comunicação, planejamento de calendário, compra de insumos (como seringas). E não é só. Por exigir duas doses em curto período de tempo, a vacinação trará um desafio inédito para todo o mundo. Será necessário assegurar que cada pessoa vacinada tomou as doses no período certo para que a vacinação tenha sucesso. Isso nunca foi realizado antes”, diz a reportagem. Num primeiro momento, ao menos, as clínicas particulares não poderão vacinar.

Segundo os especialistas, a vacina é segura. Efeitos colaterais leves são esperados, no entanto, como febre baixa e dor localizada no local da aplicação. Mas, se a pessoa tiver algum, qualquer, tipo de alergia grave, não deve tomar a vacina antes de conversar muito com seu médico.

Sobre grávidas e crianças: “Não há previsão de quando crianças serão incluídas. Elas não são grupo de risco para a Covid-19 e, antes que se pense em usar qualquer vacina nelas, será necessário ter estudos mais prolongados sobre a eficácia dos imunizantes. Nesse primeiro momento, as vacinas não são cogitadas para pessoas com menos de 16 anos. Alguns imunizantes, como o da Pfizer/BioNTech, têm sido testadas em maiores de 12 anos, mas não há previsão de quando serão aprovadas para eles. Nenhuma vacina contra a pandemia foi testada em gestantes e isso não está previsto por ora. Será necessário ter mais dados de estudos em animais para saber se os imunizantes têm qualquer impacto sobre a reprodução antes de se planejar testes com gestantes. Eles devem acontecer, mas não há calendário definido”, diz a reportagem.

A última pergunta não é menos importante: será que as duas doses da vacina serão capazes de proteger definitivamente as pessoas que tomarem?

“Não. Não se sabe porque, mas algumas pessoas não respondem a determinadas vacinas. Mas as taxas de eficácia de 95% obtidas pela vacina da Pfizer/BioNTech, por exemplo, são muito boas. No caso dessa vacina, dos 20 mil que receberam o imunizante, oito tiveram Covid-19 e uma ficou em estado grave. Já no grupo que não recebeu o imunizante, 164 desenvolveram Covid-19 e nove ficaram em estado grave”.

Por tudo isso, não é possível sair sem máscara do posto de vacinação. Em outras palavras: ainda não dá para comemorar, mesmo depois das duas doses. “Teremos que continuar a usar máscara e a fazer distanciamento social por um bom tempo. Primeiro, porque apenas parte da população será vacinada. Além disso, porque não se sabe se as vacinas vão conseguir impedir a transmissão e tirar o coronavírus de circulação ou apenas que as pessoas adoeçam com Covid-19. Somente depois que a vacinação em massa ocorrer, com uma redução drástica dos casos, as medidas de segurança poderão ser revistas”.

Embora alguns imunizantes comecem a fazer efeito dez dias após a primeira dose, o efeito completo é esperado cerca de quinze a trinta dias depois. E não se sabe dizer, ainda, por quanto tempo essas vacinas podem manter a pessoa protegida. Talvez se esteja diante de um caso semelhante ao da vacina da gripe, que precisa ser tomada anualmente.

Se o cidadão já foi contaminado, deve tomar a vacina de qualquer jeito, dizem os especialistas, porque pode aumentar a imunidade. 

PS: A foto é de Daniel Schludi

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