Ter um olhar crítico para o consumo pode ser uma resolução para 2023. Os seres vivos agradecem
macaquito agora sim

Um tema que se torna recorrente nesse período de festas é o consumo exagerado. Basta dar uma olhada em volta, hoje, depois da noite de Natal, para contabilizar mais alguns produtos em sua casa. E mais algumas embalagens, papéis. Será que tudo isso é mesmo necessário?

E este tema recorrente se liga à batalha que os ambientalistas têm travado para tentar conter as agressões que os humanos estão cometendo contra os “outros” seres vivos que dividem conosco o planeta.

Sim, consumo e biodiversidade estão interligados. Reduzindo um, podemos manter o outro num nível que será bom para nós mesmos.

 Voltando bastante na história, desde sempre o homem tem uma relação de se sentir superior à natureza. Portanto, respeitar o espaço e os direitos  de todos os seres vivos deve ser um primeiro passo a ser dado para se avançar no sentido de preservar a biodiversidade. E, assim, quem sabe, será possível pensar até num convívio relativamente harmônico (nunca será totalmente harmônico por conta das diversas naturezas, mas podemos tentar uma situação melhor do que vivemos hoje).

Neste último mês do ano aconteceu, em Montreal, uma Conferência Mundial com representantes de quase 200 países das Nações Unidas, para costurar  um acordo de preservação da biodiversidade. O encontro, chamado de COP15,  rendeu boas promessas, e sempre a torcida é para que os conferencistas avancem e não fiquem apenas na retórica.

A parte mais importante do acordo conseguido é o compromisso de proteger, até 2030, 30% das terras e águas consideradas imprescindíveis para a biodiversidade. Esta resolução ficou conhecida como “30 por 30”. Para se ter uma ideia da mudança  que este pacto propõe: atualmente, 17% das áreas terrestres e 10% das marinhas estão protegidas.

E tem mais: o Acordo de Biodiversidade de Paris, como está sendo chamado, conseguido por quase 200 países, prevê ainda arrecadar US$ 200 bilhões até 2030 para a biodiversidade. 

Dias antes de começar a COP15 – que se estendeu de 7 a 15 de dezembro – a secretária executiva da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, instituída em 2020, Elizabeth Mrema, fez circular um vídeo em que alerta para o fato de que, “na essência, biodiversidade é a base da vida; dependemos dela para alimentos, água, sequestro do carbono”.

Segundo Mrema, até o final do século XXI, cerca de 1 milhão de espécies podem estar extintas, o que mostra um nível de degradação nunca visto.

“Por anos a humanidade focou na questão das mudanças climáticas, mas recentemente estamos vendo que não se pode dissociar as mudanças climáticas do risco de perda da biodiversidade. 75% das terras do planeta estão degradadas; 66% dos oceanos estão degradados;  85% dos pântanos estão desaparecendo; 50% dos recifes de coral já desapareceram. Sem mencionar o plástico que está sufocando os oceanos. Tudo isso é resultado de ações humanas”, diz Mrema no vídeo.

Este é o link com o tempo de festas.

Hoje pela manhã, na minha caminhada, constatei o número de embalagens, restos da festa. Na ânsia de satisfazer desejos próprios e de entes queridos, exacerba-se. Com “dinheiro de plástico” nas mãos, sob a forma de cartões de débito ou crédito, fica mais fácil consumir.

Acho importante pontuar que a ideia não é chegar a consumo zero. A economia, do jeito que foi estruturada, necessita de produção e consumo. O sistema, do jeito que está sendo levado, criou o consumismo. O que precisa é haver um equilíbrio, mais respeito

Em “A história das coisas”,  livro escrito pela ambientalista Annie Leonard em 2010, o tema é  esmiuçado. E Leonard alerta:

“Enquanto consumo significa adquirir e utilizar bens e serviços para atender às necessidades, consumismo refere-se à atitude de tentar satisfazer carências emocionais e sociais através de compras e demonstrar o valor pessoal por meio do que se possui. Já o superconsumismo é quando utilizamos recursos além dos necessários e dos que o planeta pode suprir, conforme ocorre nos Estados Unidos. É quando perdemos de vista aquilo que é importante na busca por coisas”, escreve ela.

Mas o que é importante?

Nosso entorno é importante. Aliás, a palavra entorno já não é adequada, pois pressupõe que somos o centro e que tudo gira ao nosso redor. Claramente um conceito que precisa ser revisto.

Termino esta reflexão com uma notícia que foi publicada ontem (26) na agência AFP. Os ambientalistas do Camboja, país asiático, estão anunciando que há, na região, uma morte suspeita de golfinhos de água doce ameaçados de extinção segundo a organização global União Internacional para a Conservação da Natureza.

Os golfinhos que estão morrendo habitam o rio Mekong. A última morte foi de uma golfinho fêmea, com idade estimada entre 7 e 10 anos, que pesava 93 quilos. Foi fisgada e enrolada por um emaranhado de linha de pesca.

Há uma lei que proíbe a pesca na área de conservação dos golfinhos, exatamente no rio Mekong. Mas a lei não é respeitada. Nem no Camboja, nem aqui. A pesca, artesanal ou não, raramente respeita os limites necessários.

É disso que estamos falando.

O simpático macaquinho que ilustra este texto é habitante do Arquipélago do Bailique e foi clicado magistralmente pelo amigo fotógrafo Paulo Santos. Ele estava na mesma press trip que eu, no Arquipélago do Bailique, no Amapá, quando os habitantes das oito ilhas se reuniram durante dias para fazer seu Protocolo Comunitário e chamaram jornalistas para acompanhar todo o processo.

Trata-se de um documento assinado por todos para deixar acordado no papel o respeito ao meio ambiente. Respeito às preguiças, aos macacos, aos peixes. É possível caçá-los para comer, porque disso depende a nutrição dos humanos. Mas tem que ter limites, respeitar as épocas de reprodução. E todos precisam se comprometer com eles.

Precisamos de um Protocolo como esses em nível global. Podemos começar com um olhar atento e crítico ao nível de nosso consumo. Que esta possa ser uma resolução para o novo ano que começa daqui a cinco dias.

Feliz 2023, com os novos e bons tempos na política soprando para todos nós, brasileiros.

Amelia Gonzalez é jornalista, foi editora por nove anos do caderno Razão Social do jornal ‘O Globo’ e colunista do Portal G1, também da Globo. Atualmente mantém o Blog Ser Sustentável, onde escreve sobre desenvolvimento sustentável e colabora na Revista Colaborativa Pluriverso e aqui, na revista Entrenós, uma parceria da Casa Monte Alegre e a Pluriverso.

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