Psicomotricidade
bebe

O adulto diante de um bebê precisa de escuta, toque, olhar, fala. O bebê 
necessita de um adulto, uma referência, uma empatia. A partir daí, uma relação vai sendo estabelecida para desenvolver uma segurança afetiva e autonomia. 

Por Erika Reis

Da mesma forma que o adulto é importante para criança, o bebê também é importante para o adulto na construção de uma linguagem do sensível. A criança pequena convoca o corpo do adulto. É nessa relação entre adultos e bebês que os laços, afetos, movimentos, pensamentos, sentimentos vão surgindo e ganhando corpo. Acompanhar o movimento do bebê exige uma disponibilidade de entrega, de presença, de escuta, estar atento aos gestos, às sutilezas envolvidas no olhar, no sorriso, nas trocas cotidianas. Venho, cada vez mais, investindo nesta linguagem do sensível para estar diante de uma criança pequena. Como é bom aprender com afeto! Circular afeto necessita de um ambiente cuidadoso. Encontrar uma criança que chegava em minha aula chorando quando era muito pequenina e, hoje se joga em cima de mim, com um sorriso largo, confiando que ela pode se entregar, se jogar que vou segurá-la e ela não vai se machucar é bom demais para alma e para construção dessa pessoa!!! Ela voa, se arrisca com um sorriso largo e circula muito afeto! O afeto assegura a vivência, as possibilidades de entrega e movimentos!

Que alquimia é esta que uma criança chega retraída e se expande? Uma alquimia entre nós — crianças, adultos, espaços, objetos — um ambiente com suas diversidades e intensidades. Uma voz, um olhar, um gesto, uma presença, um corpo, vínculos. Explorar o espaço e encontrar mais um é o movimento essencial nos primeiros anos de vida. Permitir que a criança se desenvolva de forma livre, singular — motricidade livre, explorando as possibilidades de movimento e de relação. Confiar que a criança pequena explore seu corpo, seu mundo, o adulto colabora com sua atividade autônoma. Autonomia nos fala de uma capacidade inerente ao ser humano de por si só ser capaz de realizar algumas habilidades sem ser aprendidas. 

Ninguém ensina uma criança a brincar. Ela simplesmente brinca! E quanto mais brincar, mais rico será seu universo simbólico, seu campo relacional. Um adulto com possibilidades de brincar com a vida! Um adulto que possa explorar, experimentar e brincar com seu corpo, aproxima-se muito da comunicação corporal inerente da criança. Por que perdemos nossa autonomia de brincar quando ficamos adultos? Larrossa, nos diz:

A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.

Uma criança em desenvolvimento exige um ambiente que gere experiência, no sentido em que Larrossa nos descreve. 

Cuidar de uma criança implica presença, um contato corporal. Quanto menor, mais corporal é a relação dela com o mundo. Ela precisa explorar, experimentar, brincar. Sua comunicação é corporal. Ela fala com os olhos, com a expressão do corpo, com o choro. As crianças bem pequenas, de menos de um ano, elegem a quem confiar. Eu, como professora extra, que só os encontro uma vez por semana, nada faço sem minhas parceiras de trabalho que estão com os pequenos diariamente e são suas referências. Aos poucos, arriscam ao desconhecido, sempre buscando um contato pelo olhar, a primeira vinculação psicomotora. Começamos uma relação de confiança, e cada criança tem seu tempo de entrega para poder se arriscar em novas experimentações, em novas relações. Conforme a criança pequena vai aumentando seu mundo de relações entre os objetos, pessoas, espaço, ela enriquece tanto sua linguagem corporal, quanto se prepara para linguagem verbal a partir das experiências, do que se vive.

Estou sempre em busca do despertar de que cada criança possa viver sua autonomia, seu jeito se ser nas relações em que ela vai estabelecendo e construindo para experienciar, larrosamente falando.

A Psicomotricidade estuda o homem através de seu corpo em movimento e em relação consigo e com o mundo, e isto abre uma ferramenta que se dedica ao ser, considerando o universo de percepção próprio de cada um. Luiz Zerbini (2012) , artista plástico, retrata bem este desafio através de sua poiesis.

Não é só sobre o que se está vendo 
É sobre o que se está ouvindo quando se está vendo 
Não é só sobre o que se está ouvindo quando se está vendo 
É sobre o que se está sentindo quando se está ouvindo o que se está vendo 
Não é só sobre o que se está sentindo quando se está ouvindo o que está vendo 
É sobre o que se pensa quando se está sentindo o que se está ouvindo quando se está vendo 
Não é o que se pensa quando se está sentindo o que se está ouvindo quando se está vendo 
Não é o que se está sentindo quando se está ouvindo o que se está vendo 
Não é o que se está ouvindo quando se está vendo 
É só o que se vê

Que possamos brincar mais com as palavras, com o corpo, com as 
possibilidades de ser, criando sentidos no que acontece.

Érika Reis é arte educadora e professora da Monte Alegre. 
Fonte: Relatório de projetos da Monte Alegre

2019

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